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O assassinato de Kesaria Abramidze, modelo trans, um dia após a nova legislação anti-LGBTQ+: quem semeia discriminação, colhe violência

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Na passada quarta-feira, foi aprovada no Parlamento na Geórgia uma nova legislação anti-LGBTQ+. No dia seguinte, o namorado de Kesaria Abramidze, uma das maiores referências da comunidade LGBTQ+ do país, assassinou-a, alegadamente de forma premeditada. O suspeito, um homem de 26 anos, já detido, companheiro da vítima, terá assassinado a modelo com várias facadas, no próprio apartamento da vítima. Coincidência de datas? Não: quem semeia discriminação colhe violência.

Repare-se que este não foi um crime realizado na rua, não foi um estranho, não foi uma pessoa aleatória. Quem assassinou a modelo, com várias facadas foi uma pessoa em quem ela confiava, o seu próprio namorado, que estava na sua casa. Dito isto, a verdade mais horripilante continua a ser que as pessoas com maior probabilidade de nos fazerem mal são as que nós conhecemos: familiares, conhecidos, ex-companheiros e companheiros. Afinal, onde fica a segurança, numa casa que não é refúgio e num país que não protege os próprios habitantes?

Esta nova legislação anti-LGBTQ+ aprovada na Geórgia não só proíbe casamentos homossexuais e tratamentos de afirmação de género, como censura todos os livros, filmes e eventos de alguma forma relacionados com a comunidade LGBTQ+. Qual a “justificação” para esta legislação? “valores familiares e a proteção de menores”. Esta defesa de ideais anti-LGBT como sendo com o intuito de proteger a família e dos menores é o disfarce falacioso comum da pessoa anti-LGBT. Na verdade, uma pessoa que discrimina a comunidade LGBTQ+ quer manter o seu mundo (aparentemente) organizado com o que conhece e se sente confortável: uma sociedade composta por casais cis e hetero, em que a única opção possível é ser cis e hetero. Mas essa não é a realidade, nunca foi. As pessoas não são simples, são complexas e aí está a beleza da diversidade.

Ler um romance gay não faz de ninguém gay

Ler um livro sobre um romance gay não vai tornar uma pessoa gay. Assim como ler ou ver filmes de romances heterossexuais a vida toda não fez de mim hetero. Acima disso, não nos esqueçamos que existirem livros e filmes LGBTQ não obriga ninguém a lê-los ou vê-los, mas uma legislação que torne crime ser LGBTQ interfere diretamente com a liberdade e a segurança das pessoas, como aconteceu com a vida de Kesaria Abramidze. Mesmo assim, não nos podemos esquecer de que quem a assassinou não foi a lei, foi o namorado.

Um livro LGBT, ou um filme com boa representatividade da comunidade, pode ajudar alguém que se tem vindo a debater internamente com a sua orientação sexual ou identidade de género. Dito isto, há muitos pais e mães que têm muito medo que os seus filhos e filhas sejam gays, lésbicas, trans, porque não querem que eles/as sejam diferentes, querem ter a família tradicional, com casais hetero e filhos hetero e casamentos hetero. Porque assim tudo é mais simples e ninguém questiona nada: preocupam-se com a aparência para o exterior, com o que as outras pessoas vão achar.

No entanto, ser hetero não é a única orientação possível para os vossos filhos, nunca foi, e não é uma “escolha de vida”, é uma característica intrínseca à pessoa. Se é para terem medo, tenham medo que haja uma sociedade que poderá não aceitar os vossos filhos como eles são e transformem esse medo num motor de mudança: tentem melhorar a visão da sociedade à vossa volta de forma a que, se os vossos filhos forem LGBT, não tenham a sua vida posta em risco simplesmente por serem quem são.

As crianças não correm perigo por verem duas mulheres de mãos dadas ou dois homens a darem um beijo na rua. Isso é o equivalente a verem o pai e a mãe a darem um beijo, o pai e a mãe a darem a mão. Carinho é carinho, amor é amor. Não usem as crianças como desculpa para o vosso preconceito anti-LGBTQ+. Potenciar este preconceito não só é discriminatório como pode resultar em crimes de ódio, como a agressão e o homicídio de pessoas LGBTQ+ somente por fazerem parte da comunidade.

O futuro desta legislação

Quanto a esta nova legislação, aprovada a cinco semanas das eleições no país, ainda pode ser vetada por Salomé ZurabishviliPresidente do País. No entanto, “o partido do governo tem apoio parlamentar suficiente para contornar o veto presidencial”.

A Geórgia é, ainda, candidata à União Europeia. Tendo em conta esta legislação, Josep Borrell, Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, avisou que, se a Georgia não voltar atrás, arrisca-se a perder o estatuto de país candidato à União Europeia.

“O Parlamento Georgiano adotou leis sobre ‘valores familiares e proteção de menores’ que irão minar os direitos fundamentais do povo e aumentar a discriminação e a estigmatização. Apelo à Geórgia para retirar esta legislação, descarrilando ainda mais o país do seu caminho para a UE.” Josep Borrell, nº X, como citado pela Sic Notícias.

Nunca se esqueçam: não é por quererem muito que todas as pessoas sejam cis e hetero que elas passam a ser. Para além de imaturo, esse tipo de pensamento é perigoso para muita gente. Não semeiem discriminação, porque no futuro vão colher violência. Num dia é a Kesaria Abramidze, no outro é a vossa irmã, o vosso primo, a vossa filha, o vosso melhor amigo, ou até vocês mesmos e mesmas.


Referências:

Notícia Sic Notícias: Modelo trans assassinada na Geórgia após parlamento aprovar leis anti-LGBTQ+

Notícia BBC: Mulher trans morta na Geórgia um dia após lei anti-LGBT ser aprovada

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