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Painéis publicitários na cidade de Lisboa – a epopeia continua

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A praga da publicidade em Lisboa é um trágico folhetim que se abateu sobre a cidade e sobre os seus habitantes, e que não tem fim.

Parece que, para a Câmara Municipal de Lisboa, deixar atulhar a nossa capital de postes e luminárias de toda a forma e feitio, num desastre que espelha incompetência, insensibilidade e uma enorme falta de empatia e consideração para com os lisboetas, é um mal necessário para que entrem nos cofres da autarquia uns milhões de euros por ano.

Reagindo à crescente indignação geral, o Presidente da CML diz-se, agora, chocado com as dimensões dos painéis, por exemplo, à frente do estádio da Luz, que a própria CML autorizou, sabia e conhecia. Afirma com segurança, aparentemente imune à insanidade camarária nesta matéria, “já falámos com a empresa para parar imediatamente com estes grandes formatos.”, pondo-se assim nas mãos da empresa para se começar uma ‘óbvia’ negociação.

Ora, óbvio nisto tudo, é que a CML já tinha sido avisada por várias associações, a nossa num artigo de Julho deste ano, interpelada abundantemente por mail, reações nas redes sociais, e pela atitude lógica e drástica do ACP e da Autoridade para a Segurança Rodoviária. A tudo a resposta que dava era sempre a mesma, que a Câmara está refém do contrato, manietada por outros, impotente para agir.

Confiava a CML na eventual falta de reação dos lisboetas, das associações, da chamada sociedade civil. Saiu-lhe o tiro pela culatra e desta feita não houve silêncio.

O “jogo” fora desmascarado.

E no meio destes jogos ficam, e perdem, os cidadãos, a braços com passeios em que o peão tem de pedir licença aos mupis; passadeiras onde é preciso espreitar peões e condutores; para não falar na permanente e intrusiva chapa de luz da gloriosa ascenção do LED; percursos inteiros que fazemos de carro ou a pé, contabilizando largas dezenas de múpis e painéis luminosos; em cima de esplanadas; nos cruzamentos e entradas de túneis onde pontificam as novas torres publicitárias; nas rotundas, nas perspectivas e vistas únicas da cidade.

E com que facilidade a Câmara vai deixar passar tudo isto!

Não tendo conseguido disfarçar os painéis gigantes, sobre os quais já terá, como diz, que negociar. Negociar?

Toda a nossa atenção e reação serão poucas, se nos esquecermos do que se passa nos bairros residenciais, na Av. da República, de trânsito intenso, onde tínhamos ganhado o verde da relva e árvores, ou na artéria nobre, na Avenida da Liberdade e na própria calçada, tomadas e desfiguradas que foram, em grande escala, por este “inovador” mundo que tanto encanta o nosso autarca e alguns vereadores. Mas que tanto prejudica os cidadãos.

Afirma o Presidente da CML, numa ligação de causa-efeito tão perniciosa como astuta que, sem os milhões da publicidade, o lisboeta já não irá pagar menos impostos (ver artigo no DN, de 16.9).

O raciocínio é este: por sermos pobres, que aturemos em toda a linha a ocupação do nosso espaço público com toda a espécie de parafernália publicitária.

Custa a crer que haja uma Câmara que aceite o desastre nesta dimensão, para afirmar que assim todos nós ‘teremos’ uns euros a mais.

Tivesse a CML critérios e tivesse sabido/querido negociar desde o início o contrato com as empresas e nada disto teria acontecido. Ou acha o senhor Presidente da CML que haveria alguma empresa que deixaria de estar interessada em implantar-se em Lisboa só porque a autarquia teria fixado limites e elaborado um cuidadoso mapa de localização dessas estruturas?

A Câmara de Lisboa não é, contudo, uma mera empresa de apartado, e não deve ser um vetor acéfalo da concretização dos planos de expansão dos consórcios, não é vítima impotente de um contrato assinado por outrem.

Não defendemos a inexistência de publicidade. A única coisa que pretendemos é que a sua implantação em Lisboa obedeça a critérios de qualidade de vida, o que esta permanente e agressiva publicidade está já, sem dúvida, a retirar aos lisboetas.

Poluição e ruído visuais são o nosso dia-a-dia mas, para os nossos autarcas, são apenas abstratos conceitos que não se enquadram nas suas digitalizadas mentes. Se se enquadrassem, Carlos Moedas teria tido na área metropolitana de Lisboa uma posição diferente sobre o caos publicitário que acompanha, em toda a sua extensão, a A1 até Vila Franca de Xira. Como se não bastasse o que aí se passa, resolveu deixar que o mesmo se infiltrasse pelas artérias de Lisboa até ao mais recôndito largo.

Pedindo emprestado um termo a Miguel Sousa Tavares, é o “deboche” publicitário que entrou em grande na capital.

Estranha-se que o Presidente da CML diga que, agora, já pode negociar, que os monos de grandes formatos já poderão ser retirados das suas atuais localizações, que outros sítios haverá…

Exige-se, dada a recente loucura, que as futuras localizações sejam conhecidas antes da sua “plantação”.

Significa isto que se não fosse a providência cautelar interposta pelo ACP, o “embelezamento” publicitário da cidade continuaria a todo o gás? E os protestos das pessoas para quem diz governar, não contam?

É um facto, em toda esta malograda operação, que quem ficou em muito maus-lençóis foi a Câmara Municipal de Lisboa e os tais “novos tempos”.

Porque vendeu o espaço da cidade a empresas ávidas de lucro.

Porque sempre se colocou a Câmara, nesta ópera bufa, como a parte mais fraca e não como aquela que tem em mãos a tarefa de ordenar e salvaguardar o espaço público.

Porque quer fazer passar que se preocupa com os lisboetas e com o seu bolso, quando jogou, na verdade, com a degradação da cidade onde eles vivem.

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